Neurossífilis, HIV E Sistema Nervoso: Uma Associação Perigosa

Neurossífilis, HIV e sistema nervoso: uma associação perigosa

O Dezembro Vermelho é marcado por campanhas de informação e prevenção relacionadas ao HIV, à Aids e a outras infecções sexualmente transmissíveis (ISTs). É um período em que voltamos os olhos para temas que, embora amplamente conhecidos, ainda carregam estigma, desinformação e, sobretudo, desafios clínicos importantes. Entre esses desafios, um merece destaque especial: o impacto das ISTs no sistema nervoso.

Tanto o HIV quanto a sífilis podem afetar diretamente o cérebro, a medula espinhal e os nervos periféricos. E quando essas duas infecções ocorrem juntas (uma situação cada vez mais comum), o risco de complicações neurológicas se torna muito maior. A neurossífilis, forma grave da sífilis que atinge o sistema nervoso, pode avançar de maneira silenciosa ou extremamente agressiva, especialmente em pessoas vivendo com HIV.

Diante de um cenário de aumento de casos de sífilis no Brasil e da necessidade permanente de vigilância sobre o HIV, compreender essa associação perigosa é um passo fundamental para melhorar o diagnóstico, o tratamento e a prevenção.

Por que sífilis e HIV caminham juntas?

A relação entre as duas infecções não é coincidência. Há diversos fatores que explicam por que sífilis e HIV frequentemente aparecem associadas:

  • Compartilham fatores de risco: ambas são transmitidas principalmente por contato sexual desprotegido.
  • A sífilis facilita a transmissão do HIV: as lesões ulceradas típicas da sífilis aumentam a vulnerabilidade às partículas virais.
  • O HIV altera a resposta imunológica: isso acelera a progressão da sífilis para estágios mais graves.
  • Coinfecção muda o comportamento da sífilis: em pessoas vivendo com HIV, a doença pode ter manifestações atípicas, mais rápidas e mais difíceis de identificar.
  • A desinformação e o estigma atrasam o diagnóstico: muitos pacientes passam meses ou anos sem saber que estão infectados.

O que é neurossífilis e por que pode ser mais agressiva em pessoas com HIV?

A neurossífilis é uma complicação da sífilis causada pelo Treponema pallidum, quando a bactéria invade o sistema nervoso central. Embora possa ocorrer em qualquer fase da doença, ela é mais comum em infecções prolongadas ou mal tratadas. Em pessoas com HIV, especialmente quando a carga viral não está controlada, essa invasão tende a ocorrer de forma mais rápida e com sintomas mais intensos.

Formas clínicas e desafios da neurossífilis

A neurossífilis não é uma única manifestação, mas um conjunto de apresentações que podem variar de sutis a devastadoras. Ela pode surgir como inflamação das meninges, causar quadros vasculares (como AVC em pacientes jovens), provocar degeneração progressiva do cérebro ou comprometer raízes nervosas. Além disso, existe a neurossífilis assintomática, quando o paciente não percebe nada, mas o sistema nervoso já está infectado. Em pessoas vivendo com HIV, esses quadros podem aparecer mais cedo e evoluir de forma irregular, dificultando o diagnóstico.

Sintomas neurológicos que merecem alerta

Os sinais podem surgir de forma lenta ou súbita, e variam bastante. Pacientes podem apresentar dores de cabeça frequentes, alterações de comportamento, confusão mental, fraqueza, dificuldade para caminhar, alterações na visão ou na audição, crises convulsivas ou sintomas psiquiátricos que inicialmente parecem depressão, ansiedade ou até psicose. Em muitos casos, esses sintomas são atribuídos a outras condições, o que contribui para atrasos no diagnóstico.

O desafio do diagnóstico tardio

A combinação HIV + sífilis pode mascarar sintomas ou alterar marcadores laboratoriais. Muitos pacientes também relutam em relatar sintomas neurológicos por medo do estigma. Somado a isso, profissionais de saúde nem sempre associam alterações neurológicas a uma IST, especialmente quando o paciente não relata exposição de risco ou quando a sífilis não se manifesta nas fases clássicas com lesões cutâneas.

O papel do exame do líquor: quando investigar?

A punção lombar e a análise do líquido cefalorraquidiano (LCR) são fundamentais para o diagnóstico da neurossífilis. Para profissionais da saúde, há situações claras em que o exame deve ser solicitado:

  • Pacientes com sífilis e sintomas neurológicos: mesmo que discretos.
  • Sífilis ocular ou otológica: visão turva ou perda auditiva exigem análise do LCR.
  • Coinfecção com HIV: especialmente quando a carga viral está alta ou o CD4 está baixo.
  • VDRL de sangue muito elevado: alguns valores sugerem risco maior de invasão do sistema nervoso.
  • Falha terapêutica: quando a sífilis persiste após o tratamento adequado.
  • Testes não treponêmicos que não caem como esperado: sugerindo atividade persistente da infecção.

No LCR, avaliam-se a presença de células inflamatórias, aumento de proteínas, positividade do VDRL e outros biomarcadores que ajudam a confirmar o diagnóstico.

Em pessoas com HIV, a interpretação do LCR deve ser ainda mais criteriosa, pois a própria infecção pelo HIV pode alterar alguns parâmetros.

Tratamento: urgência e particularidades da coinfecção

O tratamento da neurossífilis é eficaz, mas precisa ser iniciado com rapidez. Diferentemente das fases iniciais da sífilis, que costumam ser tratadas com penicilina benzatina aplicada no músculo, a neurossífilis exige hospitalização para administração intravenosa de penicilina cristalina durante vários dias.

Além da terapia antibiótica, é importante monitorar sintomas neurológicos, controlar crises convulsivas quando presentes e acompanhar a evolução do paciente por meses ou anos.

Em pessoas vivendo com HIV, o controle da carga viral é determinante para evitar complicações. A adesão à terapia antirretroviral melhora a resposta ao tratamento da neurossífilis e reduz a chance de novos episódios.

Outro ponto fundamental é o acompanhamento pós-tratamento. O paciente precisa realizar novas avaliações do LCR até que os parâmetros voltem ao normal. Só assim é possível confirmar a cura ou detectar uma possível recidiva.

Prevenção: o verdadeiro foco do Dezembro Vermelho

A combinação entre neurossífilis e HIV é perigosa, mas evitável. Por isso, o Dezembro Vermelho reforça a importância de um conjunto de estratégias preventivas:

  • Prevenção combinada
  • Uso de preservativos em todas as relações sexuais.
  • PrEP e PEP, que reduzem drasticamente o risco de infecção pelo HIV.
  • Testagem regular, disponível gratuitamente na rede pública.
  • Tratamento imediato da sífilis, mesmo quando assintomática.
  • Acompanhamento periódico para pessoas vivendo com HIV.

Essas medidas reduzem a transmissão, facilitam o diagnóstico precoce e ajudam a evitar sequelas neurológicas.

Educação e combate ao estigma

A prevenção também passa pelo diálogo. O medo do julgamento ainda impede muitas pessoas de buscar atendimento médico ou relatar sintomas neurológicos que podem estar associados às ISTs. Informar, acolher e orientar são estratégias que salvam vidas.

Além disso, capacitar profissionais de saúde para reconhecer manifestações neurológicas associadas a ISTs é essencial. Muitas vezes, a neurossífilis só é diagnosticada porque um exame do líquor foi solicitado no momento certo.

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