
Covid-19 e sistema nervoso: cinco anos depois, o que já sabemos?
Cinco anos após o início da pandemia de Covid-19 no Brasil e os primeiros períodos de quarentena, a ciência avançou significativamente na compreensão dos impactos do vírus no organismo humano, especialmente no sistema nervoso central.
Desde os primeiros casos, médicos e pesquisadores observaram manifestações neurológicas associadas à infecção, que variam de sintomas leves, como dor de cabeça e perda de olfato, até complicações mais graves, incluindo AVC, encefalites e distúrbios neurodegenerativos. Além disso, a chamada Covid Longa tem revelado sequelas persistentes, como fadiga crônica, dificuldades cognitivas e transtornos psiquiátricos.
Neste texto, exploramos o que a ciência já sabe sobre a relação entre a Covid-19 e o sistema nervoso, destacando as descobertas mais relevantes dos últimos anos.
Como o Sars-CoV-2 afeta o sistema nervoso?
Desde os primeiros meses da pandemia, pesquisadores identificaram que a Covid-19 não se limitava somente ao trato respiratório. O vírus Sars-CoV-2 pode afetar diversos sistemas do corpo, incluindo o sistema nervoso central (SNC), desencadeando uma série de complicações neurológicas. Esse impacto ocorre por diferentes mecanismos, que ainda são objeto de estudo, mas já apresentam evidências consistentes.
Invasão direta do SNC
Uma das hipóteses para a presença do vírus no sistema nervoso é sua capacidade de invadir diretamente as células neurais. Estudos indicam que o Sars-CoV-2 pode utilizar receptores da enzima conversora de angiotensina 2 (ECA2), presentes em células do endotélio cerebral e em neurônios, para penetrar no SNC. Além disso, acredita-se que o vírus possa alcançar o cérebro por meio do nervo olfatório, o que explicaria a alta incidência de perda de olfato (anosmia) em pacientes infectados.
Resposta inflamatória exacerbada (tempestade de citocinas)
Outro mecanismo amplamente estudado é a resposta inflamatória intensa desencadeada pelo vírus. Em casos graves de Covid-19, o sistema imunológico libera uma grande quantidade de citocinas pró-inflamatórias, um fenômeno conhecido como tempestade de citocinas. Essa inflamação sistêmica pode causar danos às células nervosas, desencadeando complicações como encefalite e comprometimento cognitivo.
Dano vascular e eventos trombóticos
A Covid-19 também tem sido associada a um aumento do risco de eventos trombóticos, como acidentes vasculares cerebrais (AVC). Isso ocorre porque o vírus pode causar disfunção endotelial, levando à formação de coágulos sanguíneos e comprometendo a circulação no cérebro. Pacientes com formas graves da doença apresentam maior propensão a desenvolver AVC, especialmente aqueles com fatores de risco pré-existentes, como hipertensão e diabetes.
Principais manifestações neurológicas
Desde o início da pandemia, muitos pacientes relataram sintomas neurológicos já nos primeiros dias da infecção, variando de quadros leves e transitórios a complicações mais graves e duradouras. Entre eles:
- Perda de olfato e paladar (anosmia e ageusia): Um dos primeiros sinais neurológicos amplamente reconhecidos da Covid-19 foi a perda repentina de olfato (anosmia) e paladar (ageusia). Esses sintomas podem surgir mesmo em casos leves e ocorrem devido à inflamação e ao dano às células do epitélio olfatório no nariz. Embora a maioria dos pacientes recupere essas funções em algumas semanas, há relatos de persistência ou distorção dos sentidos por meses, um quadro conhecido como parosmia.
- Encefalite, meningite e confusão mental: Casos mais graves de Covid-19 podem desencadear processos inflamatórios no cérebro, levando a condições como encefalite (inflamação do tecido cerebral) e meningite (inflamação das membranas que envolvem o cérebro e a medula espinhal). Em alguns pacientes, o quadro de confusão mental persiste mesmo após a fase aguda da infecção, sendo uma das manifestações do Covid Longa.
- Acidente Vascular Cerebral (AVC) e distúrbios trombóticos: O Sars-CoV-2 tem sido associado a um risco aumentado de eventos trombóticos, incluindo AVCs isquêmicos e hemorrágicos. O vírus pode causar disfunção endotelial e hipercoagulação, favorecendo a formação de coágulos sanguíneos que podem bloquear vasos cerebrais.
- Síndrome de Guillain-Barré e neuropatias periféricas: Outro efeito neurológico observado é o desenvolvimento da Síndrome de Guillain-Barré, uma condição autoimune em que o sistema imunológico ataca os nervos periféricos, causando fraqueza muscular progressiva e, em casos graves, paralisia.
Sequelas neurológicas a longo prazo (Covid Longa)
Mesmo após a recuperação da infecção aguda, muitos pacientes continuam apresentando sintomas persistentes, um quadro conhecido como Covid Longa ou Síndrome Pós-Covid. Entre as sequelas mais preocupantes estão aquelas que afetam o sistema nervoso, impactando a cognição, a mobilidade e a saúde mental. Essas manifestações podem durar meses ou anos, comprometendo significativamente a qualidade de vida dos pacientes.
Fadiga crônica e distúrbios do sono
A fadiga crônica é uma das queixas mais comuns entre os pacientes com Covid Longa. Trata-se de um cansaço extremo que não melhora com o repouso e que pode dificultar atividades diárias simples. Além disso, distúrbios do sono, como insônia, sono fragmentado e sonolência excessiva durante o dia, são frequentes, agravando ainda mais o quadro de exaustão.
Comprometimento cognitivo (brain fog)
Muitos pacientes relatam dificuldades cognitivas após a infecção, um fenômeno popularmente chamado de brain fog (névoa cerebral). Esse quadro se manifesta por meio de lapsos de memória, dificuldades de concentração, raciocínio lento e desorganização mental.
Relação com transtornos psiquiátricos
A Covid Longa também tem sido associada a um aumento na incidência de transtornos psiquiátricos, incluindo ansiedade, depressão, síndrome do pânico e transtorno de estresse pós-traumático (TEPT). Esses distúrbios podem ser resultado da resposta inflamatória do organismo, da neuroinflamação induzida pelo vírus ou do impacto psicológico da experiência com a doença.
Possível associação com doenças neurodegenerativas
Pesquisas recentes sugerem que a infecção pelo Sars-CoV-2 pode acelerar processos neurodegenerativos em indivíduos predispostos. Estudos indicam que pacientes que tiveram Covid-19 apresentam maior risco de desenvolver doenças como Alzheimer e Parkinson, possivelmente devido à inflamação crônica no cérebro e ao aumento do estresse oxidativo. No entanto, essa relação ainda está sendo investigada, e mais estudos são necessários para confirmar essas hipóteses.
O que ainda precisa ser investigado?
Apesar dos avanços na compreensão dos impactos neurológicos da Covid-19, muitas questões ainda permanecem sem resposta. A complexidade da interação entre o Sars-CoV-2 e o sistema nervoso exige estudos contínuos para entender melhor os mecanismos que levam às manifestações neurológicas e, principalmente, às sequelas de longo prazo.
1. Por que algumas pessoas desenvolvem sintomas neurológicos e outras não?
Ainda não está claro por que alguns pacientes apresentam sintomas neurológicos graves, enquanto outros não têm nenhuma manifestação desse tipo. Fatores como predisposição genética, estado imunológico prévio e a gravidade da infecção podem desempenhar um papel importante, mas essa relação ainda não está completamente elucidada.
2. Como tratar e reverter os danos neurológicos da Covid Longa?
Embora algumas abordagens terapêuticas, como fisioterapia e reabilitação cognitiva, tenham mostrado benefícios para pacientes com Covid Longa, ainda não há um tratamento específico para reverter os danos neurológicos causados pelo vírus. Ensaios clínicos continuam a buscar novas terapias para aliviar os sintomas persistentes.
3. Por quanto tempo os sintomas da Covid Longa podem persistir?
Algumas pessoas relatam sequelas neurológicas que duram anos após a infecção, levantando preocupações sobre o impacto a longo prazo. O tempo de duração desses sintomas e a possibilidade de recuperação completa ainda são questões em aberto, exigindo acompanhamento de longo prazo dos pacientes.
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